Relato de uma professora de apoio: O menino Wellington
Iniciei minhas atividades no Ensino Especial em 2005, no extinto col. Est. Ministro Nasser, situado na Vila Nova. Naquela época estava saindo de uma coordenação muito estressante no período matutino e havia uma vaga para professora de apoio, a qual foi reivindicada por mim.
Inicialmente fiquei meio assustada por estar frente a uma nova situação e quase sem saber o que fazer fui me adaptando à função paulatinamente. Por lá fiquei até 2008, adquirindo vasta experiência, tanto com os alunos quanto com o trabalho de parceria com os professores regentes.
Em 2009 tive a oportunidade de vir a trabalhar no Col. Est. Waldemar Mundim, mais próximo da minha casa e iniciando, nesta unidade, um trabalho com o ensino especial, pois a mesma já possuía alunos com necessidades educacionais especiais, porém, sem ainda possuir no quadro de professores, profissionais com experiência na área.
Foi nesta escola que conheci dois alunos muito especiais para mim: Fabrício e Wellington. Fabrício, um aluno com TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade), transtorno bipolar depressivo e retardo mental, muito me preocupou inicialmente. Muito agressivo, agitado e sem nenhuma vontade de aprender ou realizar qualquer tipo de tarefa. Foram muitas noites mal dormidas e muito choro da minha parte, (presenciado por colegas) até conseguir um laço afetivo com ele para que pudesse realizar algum tipo de trabalho. Muito ainda há por fazer, mas o aluno hoje se mostra bastante receptivo comigo, demonstrando confiança, carinho e ternura. O comportamento dele mudou significativamente, apesar do pouco desenvolvimento em outras áreas.
Wellington, que em decorrência de uma toxoplasmose congênita tornou-se portador de deficiência intelectual e visual, é o assunto principal deste relato. Anjo que tropeçou lá no céu e cá na Terra caiu, assim digo a ele. E anjo é o que parece ser, de tanta ternura que o cerca. É amável sempre. Nunca muda o seu humor e está sempre feliz.
Wellington, não reconhece as próprias necessidades, precisando sempre de alguém que lhe forneça apoio até para o mais básico para a sua sobrevivência, como água, alimentos e também que o leve ao banheiro de tempo em tempo. Nunca reclamou de dores ou mal-estar, mesmo quando se sente mal e o corpo dele se manifesta. Gosta de ficar sempre em um lugar só. Incomoda-lhe tanta mudança de lugar, mas com jeito tudo se consegue com ele.
Esse anjo parece viver em outro mundo, num mundo só de alegrias e pessoas sem maldades. Inocente ele beija a parede onde fica encostada a sua cadeira e diz que é bom beijar parede, e ainda insiste: “está escrito nos dez mandamentos, tem que beijar a parede”.
Um ser dócil, divino, sem nenhum pecado, que uma mãe caridosa ganhou de presente, enquanto outra abriu mão dele. Dona Luzia é a mãe do coração que o cria, quase da mesma forma que Deus criou o homem, com todo o amor do mundo e dedicação extrema.
Não há, na unidade escolar, pessoa que não o conheça bem, mesmo que de vista, passando pelos corredores e ouvindo os seus comentários sempre bem-humorados sobre as dificuldades de ir para as salas ambientes, adotadas por esta escola.
O aluno estudou na Pestalozzi por longos anos, ainda assim não conseguiu dominar o Braille e nem o sorobã, mas sabe a função de cada um e nas aulas de português e matemática sempre faz questão de ter estes recursos em mãos, dada a seriedade que tem com os estudos. Apresenta trabalhos adaptados na frente da sala sem nenhum constrangimento e fica feliz quando tem essa oportunidade e ainda pergunta: “tirou foto?”
Impressiona-me tanta dedicação por parte da família que o adotou e, particularmente, dele também, visto que sempre se mostra receptivo com as atividades que lhes são propostas e as executa, dentro das suas possibilidades, com toda a dedicação possível, mesmo que seja apenas riscar um papel com uma caneta, com sua pouca habilidade para tal.
A possibilidade de progresso com o aluno está nas atividades diárias e na música (canto) a qual já está sendo trabalhada, pois o mesmo gosta muito de cantar, possuindo ritmo e uma voz encantadora, porém tem muita dificuldade para decorar a letra das músicas.
Para encerrar quero dizer que nesses três anos de acompanhamento deste aluno muito tenho tentado lhe ensinar, porém o mais fascinante é que descobri que quem está aprendendo não é ele comigo, sou eu com ele.
Professora Neusa (apoio).
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